domingo, 23 de março de 2008

Chocolate Ultra-Congelado, no sítio do costume


Devo confessar que a minha visão da Páscoa é aquela que a maioria das pessoas tem: férias e doces. Para mim, Páscoa significa poder ficar acordado até tarde e ter na televisão, ao despertar, um reclame do Pingo Doce a umas amêndoas “de grande qualidade”, logo seguidas de uvas sem grainha, e tudo a preços mais convidativos do que os produtos em si. Páscoa é ficar a chupar os dedos depois de encontrar chocolates roubados em qualquer canto da casa da minha avó, é arrumar por detrás das montras os aliciantes do dia dos namorados e lá pôr quaisquer coisas que estejam relacionadas com coelhos, ovos, amêndoas e outras coisas com corantes. A Páscoa é não poder ir comprar leite a um mini mercado sem quase nos sentirmos obrigados a levar connosco um ovo gigante de chocolate da Kinder. É deitar-me no sofá depois de comer – a bem dizer, enfardar – cabrito seguido de leite-creme com amêndoas (estas, sem cobertura), baba de camelo, gelatinas variadas, frutas e um ovo de chocolate para desenjoar.
A Páscoa é, para muita gente, um período de reflexão espiritual. Por isso, decidi também reflectir. Mas parece-me que há uma diferença entre mim e os outros pensadores: eles têm questões e pensam tentando chegar a respostas; eu não tenho questões, começo a pensar e então que, de repente, elas surgem. E o pior é que não chego às respostas.
Por exemplo, uma coisa que me deixa indignado é o facto de um coelho dar ovos. Na minha reflexão, ver um coelho a dar ovos é a mesma coisa que assistir a uma galinha a parir. Estamos perante um fenómeno raro, que acontece uma vez por ano, que é um coelho – ainda por cima macho – a pôr ovos. E um coelho que, pelos anos que já deve ter, já devia ter chegado à menopausa (ou andropausa? A minha confusão aumenta). Mas não há nada de lógico num coelho masculino que põe ovos de chocolate. Só pode ser um mutante ou uma vítima de algum acidente nuclear.
Mas este invulgar acontecimento, o de um coelho a produzir ovos de chocolate, não é caso único em termos de coisas bizarras características da época. Parece que há uns anos – dizem-me fontes seguras – ressuscitou um homem chamado Jesus, que tinha morrido na anterior sexta-feira. Morreu na sexta, ressuscitou no Domingo. É estranho que ainda ninguém tenha avançado com a possibilidade de que Ele possa apenas ter adormecido. Eu pessoalmente já dormi sestas que duraram quase tanto tempo. E nenhum coelho anda a cagar ovos só porque eu dormi tempo demais.
Depois, falta à Páscoa um grande espírito que é injectado em qualquer ser humano que se preze, como acontece no Natal. Um mês antes do Natal, já andam todas as pessoas a desejar “Feliz Natal” umas às outras. Se eu, há um mês, andasse a desejar “Feliz Páscoa” ou “Come muitas amêndoas”, ou me mandavam internar ou me escondiam um calendário no folar. “Feliz Páscoa” só a partir da Quaresma, e é para quem se lembra. E nessa questão de espírito, a Páscoa sai muito a perder em relação ao Natal. Na Páscoa, ninguém põe coelhos gigantes a subir aos telhados, e coisa que não existe é “A Páscoa dos Hospitais” ou “A Páscoa das Prisões” – o que até é um ponto a favor da Páscoa – não há gorjetas maiores que o habitual, o dinheiro ganho pelos pedintes não sobe em flecha, as crianças não andam pela casa à procura dos ovos, nem as mais novas se escondem nem fazem uma chinfrineira porque o coelho entrou; em vez de dar o “Sozinho em Casa” cem vezes, dá o “Ben Hur” apenas cinquenta, não há emissões de quatro horas para uma árvore gigante com lamparinas em cima.
Falta, portanto, espírito à Páscoa. E como se chamaria um eventual espírito? Espírito Pascoal? Pascoal só me faz lembrar o bacalhau. E o bacalhau come-se quando? No Natal.
É inevitável. O Natal ganha.

6 comentários:

Anónimo disse...

O Natal não ganha.
Porque se no Natal comemoramos o nascimento de Cristo, na Páscoa voltamos a comemorar o seu "nascimento" após a sua morte.
É tudo uma questão de fé.


- ainda que prefira o Natal a Pascoa.

Rita M.

Anónimo disse...

Morrer para renascer é o que fazemos todos os dias, segundo a tua teoria. A natureza adormece no Inverno e acorda na Primavera. Jesus traz algo de novo para o ser
humano, uma doutrina com ideias completamente novas, em relaccao à
maneira de pensar Judaica do seu tempo: TODO HOMEM É MEU IRMAO!
Nao é isto um acordar ou ressuscitar para uma mentalidade nova?

Anónimo disse...

Neste artigo, querido Didocas, misturaste muito a Mitologia Crista com a Germanica.
Os coelhos nao dao ovos, apenas os distribuem como o pai Natal, ele traz os presentes, mas nao os constrói.
Saudacoes gélidas de Düsseldorf!

Anónimo disse...

Ok. Mas mesmo acreditando que os coelhos trazem os ovos sem os pôr, já que lhes foi dada essa capacidade, não teria sido possível dar às galinhas pelo menos uns molares para trincar as amêndoas?...
São estas coisas que fazem vacilar a fé dum homem, caraças!

Já agora há, de facto, uma lenda germânica que conta a história duma mulher que escondeu uma cesta de ovos coloridos para os filhos encontrarem na Páscoa e que os filhos, ao se aproximarem do cesto e vendo uma lebre (e não um coelho) a correr, se convenceram de que os ovos tinham sidom postos por ela. E esta lenda parece ser a mais antiga associação de lebres e ovos. Há ainda referências muito pouco claras a um suposto deus germânico, Eostre, que tinha uma ave - que, como tal, punha ovos - e um dia, se transformou em lebre. E como a palavra "Eostre" é parecida com a a palavra alemã para Páscoa, além de algumas outras associações um pouco forçadas entre a tradição persa da troca de ovos no ano novo e a conversão ao cristianismo dos antigos povos germânicos pagãos, enfim, os Alemães querem também protagonizar um pouco esta história dos coelhos, dos ovos e da Páscoa. Eu não me importo... :)))
Mas a tradição da troca dos ovos de chocolate é, sem sombra de dúvida, francesa.

Questões com respostas pouco claras, no fundo. Mas gostei da pesquisa que fiz. Sempre me ocupou uns minutos deste meu último dia de dolce fare niente.

Anónimo disse...

Titulo digno d euma campanha do Pingo Doce xD
Natal vs Páscoa -> empate, isto é não se trata de um "confronto" mas tudo não passa de uma questão religiosa e em que o comercio faz de tudo para sair a lucrar. Simbolicamente o Natal não deveria ser Prendas, as quais muitas crianças atribuem o significado natalício, mas sim a união, família, nascimento de Cristo, já a Páscoa é igual, as prendas dos padrinhos, amendoas, mais doçaria, e não como diz a Rita o seu "renascimento" ("nascimento" após a sua morte, por palavras da Rita) ...

^^
Just_me

Anónimo disse...

Diz o grande livro que Cristo ressuscitou para uma nova vida. Ora ele voltou a (re)nascer para os homens, para os seus irmãos, e mesmo para aqueles que o condenaram.
O que acho, é que em niveis de fé, a Páscoa é muito mais significativa porque simboliza o transcender sobre a morte.
Como cristã, reconheco 1 valor maior à Páscoa por estes motivos, embora goste mais do Natal, independentemente do materialismo.

Rita M.